segunda-feira, julho 30, 2007

Barriga pra dentro

Não sei se contagiado pelo clima do Pan ou pela dificuldade de me abaixar para apanhar as moedas que eventualmente caem ao chão, o certo é que me matriculei numa academia de ginástica. Nenhuma novidade nisso - esta deve ser, por baixo, a décima vez em que entro numa academia, embora torça para que a história desta vez seja diferente. O começo ao menos tem sido animador: em apenas uma semana eu já fui malhar cinco vezes. Eu sempre achei que malhar era um termo que eu não escreveria aqui e muito menos colocaria em prática na vida. Mas o tempo passa e, como escreveu a Maria Adelaide Amaral em uma de suas peças, com a idade, a única coisa que ainda sobe é a gengiva.

O responsável pelo meu retorno às academias de ginástica é o amigo e também jornalista Gustavo Fioratti. De todas as pessoas que conheço, ele é o principal defensor da tese de que uma hora de musculação coloca a auto-estima nas nuvens, muito mais do que a terapia, o chocolate ou a compra de roupas. "Quando você se apaixonar pelos halteres, sua vida vai ser outra", ele sempre me disse. Acredito que, como todo mundo, já me apaixonei por muitas coisas e pessoas estranhas, mas os halteres continuam sendo, para mim, uma das imagens mais indesejáveis e menos sexy do mundo. Em todo caso, estou flertando com vários deles há oito dias e até o momento eles se mostraram mais fiéis que os amores humanos: estão sempre onde prometeram estar e a dor que eles me provocam não é apenas tolerável, às vezes é até gostosinha. E, também ao contrário das paixões humanas, há sempre um treinador me dizendo que é hora de parar ou vou me arrepender no dia seguinte.

No fundo, eu sei que vou para a academia muito mais para conversar e, confesso, ouvir a conversa alheia enquanto rolam as esteiras. Já fiquei sabendo de um namoro que terminou, de um rapaz que começou a morar sozinho somente agora, com 30 anos, e que por isso não quer namorar ninguém até se enjoar da liberdade tardiamente conquistada, de um senhor que machucou os pés e por isso só aparece lá para fazer levantamento de peso deitado e, claro, de um pai de dois garotos que escapou por pouco de embarcar no vôo da TAM. A academia tem sido também uma prova de que as tristezas vão ficando para trás: a cada dia se fala menos da tragédia com o avião.

Se eu pudesse escolher, nas academias só haveria esteiras. Seríamos uma legião de pessoas andando e correndo sem jamais sair do lugar, uma deliciosa metáfora para algumas fases de nossas vidas. Andar na esteira é um prazer, é como se nossos corpos fossem divididos ao meio por algum mágico: enquanto da cintura para baixo o trabalho é automático, do umbigo para cima nós estamos em outro lugar, fazendo outras coisas, pensando em outras paisagens e tentando resolver questões mais urgentes do que o extermínio de pneus na nossa barriga. Sem o risco de assaltos, atropelamentos, cocô de cachorro na calçada e buracos na rua, o nosso cérebro descansa enquanto as pernas cumprem com obediência uma missão que, para elas, talvez não tenha sentido algum. Também não gosto de ficar olhando para aquele painel que mostra a queima de caloria, a velocidade, o trajeto percorrido, nada disso. Até porque a gente sabe que, depois, um único brigadeiro do Amor aos Pedaços vai implodir uma hora de malhação. A natureza não consegue ser justa nem na hora de queimar calorias.

Mas os professores, e são inúmeros, não gostam que a gente fique só na esteira. A todo instante eles vêm perguntar se está tudo bem, quando na verdade querem dizer: saia logo daí para levantar peso. E daí começa a parte chatinha: duas séries disso, três séries daquilo, 20 segundos deste lado, 30 segundos daquele. E o cérebro, que até então estava passeando, tem de voltar a trabalhar, a contar de um a 30 bem devagarzinho, a registrar os exercícios que já fizemos e apontar os que ainda faltam e, principalmente, ficar atento a alguma dor ou fisgada que, ao menos no meu caso, ainda surgem com frequência. Depois disso, é só voltar pra casa com a sensação de algum dever cumprido, embora o dia esteja só começando.

PENSAMENTO DO DIA
"A maior felicidade que existe é quando a gente vai limpar a bunda e percebe que ela já está limpinha".
Do Gustavo Fioratti, que me levou à academia para ouvir coisas deste tipo.

4 comentários:

flávia coelho disse...

Olha só que curioso Sérgio, eu acho muito chata a parte da esteira e adoro fazer as séries de musculação, aliás não faço nem uma coisa nem outra há tempos. Estou há meses tentando me animar...
Mas é bonita sua percepção das coisas, até na academia!
Beijos.

alberto disse...

Persevere, querido. Não é nem pela estética, é pela saúde. MEEERDAAA nessa empreitada!

Valmir Junior disse...

Vai, força, inspira, expira, finja que está indo pelo bem da barriga, mas vá pelo estudo humano. Beeeeeeeem melhor. Abração!!!

Bruno Silva disse...

... Ki iniciativa maravilhosa..

Gosteii Muito de seu blog..