sábado, julho 31, 2010

Susto

Faz um tempinho, fui visitar minha mãe e a encontrei muito nervosa. Uma prima dela havia tentado o suicídio pouco antes de eu chegar. Alguns parentes tinham acorrido à casa dela, a prima. Como eram vizinhas, estranhei a ausência de ambulância ou qualquer outro veículo de socorro na rua. Perguntei como estava a prima e minha mãe respondeu que ela já estava se recuperando.

Estranhei e pedi detalhes da história. Minha mãe contou que a prima, que estava enfrentando alguns quadros de depressão, tinha acordado especialmente triste naquela manhã. Mal saíra da cama. O marido dela foi trabalhar mas, por andar preocupado com o caso, resolveu dar uma passadinha em casa na hora do almoço. Encontrou a mulher desacordada, com uma garrafa de cerveja e um frasco de remédios, ambos vazios, em cima do criado-mudo. Assustado, ele chamou parentes e vizinhos e então começaram a reanimar a mulher. Em pouco tempo, ela acordou. Meio grogue, sem falar coisa com coisa. Deu um olhar de desprezo para toda aquela gente que enchia o quarto dela, virou de lado e voltou a dormir.

Só então o marido foi examinar o frasco de remédio que a mulher havia mandado goela abaixo. Era homeopatia. Ela tomou uma garrafa de cerveja com 30 bolinhas de açúcar. Ao ser acordada pelo marido, devia estar somente bêbada e feliz.

“E a senhora está tão nervosa por causa disso?”, perguntei. “É, desta vez foi homeopatia”, respondeu minha mãe. “Mas vá saber da próxima....”

sexta-feira, julho 23, 2010

Reloginho

"Meu problema é que eu nasci cedo demais, comecei tarde demais e agora não dá mais tempo"

Do personagem Mamma Rose, no finalzinho do musical Gypsy

quarta-feira, julho 21, 2010

Vapt-vupt

Saí para almoçar com um amigo que eu não via fazia um tempinho. Ele me contou que, dia desses, conheceu uma garota enquanto ia para a padaria. Eles se cruzaram na rua e ela olhou com insistência para ele, o que o encorajou a pedir o número do telefone dela. Ela deu. Naquela mesma noite, ele lhe telefonou. Ela disse que morava ali no bairro, e que ele estava convidado a visitá-la na mesma hora. Ele foi. Rolou.

Depois desse primeiro encontro, ele foi lá outras vezes. Na última vez em que a visitou, ele estava voltando da padaria. E ele terminou seu relato com a seguinte frase, na minha opinião já histórica. "Eu ando tão pouco romântico, mas tão pouco romântico que, saindo da padaria, eu passei na casa dela, fiz o que tinha de fazer e, ao chegar em casa, o pão ainda estava quentinho".

O Itaú me dá uma saudade do Unibanco

Se é que é possível se gostar de um banco, confesso aqui que gostava muito do Unibanco. Não só gostava, sinto uma imensa saudade . Eu achava o Unibanco um banco simpático por várias razões. Em primeiro lugar, por ele patrocinar um dos cinemas mais bacanas da cidade, o meu predileto não apenas pela programação, mas por que ali eu pagava meia...algo que, nos dias atuais, tem de ser levado muito em consideração. Em segundo lugar, porque as agências do Unibanco que eu freqüentava, na Rua Heitor Penteado e na avenida Paulista, não tinham aquela pavorosa porta eletrônica e eu nunca fui obrigado a deixar meu cinto, meu celular e minhas moedinhas naquela gavetinha para poder entrar na agência. Em terceiro lugar, porque raramente estas agências tinham fila (vai ver que é por isso que elas foram fechadas). E, finalmente, porque tudo o que eu não conseguia resolver pela internet, eu conseguia resolver pelo telefone. Os gerentes me conheciam e confiavam em mim.

Em dezembro do ano passado, uma gerente do Unibanco me ligou para dizer que minha conta estava sendo migrada para o Itaú, onde eu encontraria o mesmo nível de atendimento que desfrutava no Unibanco. Melhor dizendo, minhas duas contas, uma como pessoa física e outra como pessoa jurídica. Acho que ninguém precisa ser um expert em serviço bancário para concluir que é muito mais fácil centralizar estas duas contas em uma mesma agência, não é? Pois o Itaú não pensa assim. Eles transferiram minha conta de pessoa física para uma agência e a de pessoa jurídica para outra. Quando fiquei sabendo disso, logo pensei: vai dar merda. Não deu outra.

Somente agora, depois de seis meses sendo cliente do Itaú, consegui um cartão da conta da pessoa jurídica para poder transferir meu dinheirinho para a conta de pessoa física. Até então, passei seis meses indo até uma papelaria a três quadras da minha casa para passar um fax solicitando a transferência. Isso mesmo: fax, no século 21. Claro que na maioria das vezes, o número do fax estava ocupado, e eu tinha de voltar mais tarde. Teve uma segunda-feira em que consegui passar o fax na quarta tentativa. Comecei às dez da manhã e só consegui às três da tarde. Eu não acreditava em mim mesmo, subindo e descendo o dia inteiro com um fax nas mãos.

As agências do Itaú vivem lotadas. Tentar falar com um gerente pelo telefone é um teste de paciência que nem um budista aguenta. E, claro, eles têm porta eletrônica e a gente só entra no banco se estiver praticamente pelado.

Sei que este post é o mais chato que eu já escrevi na vida. Mas ele tem um motivo: fiquei sabendo que, pelo segundo ano consecutivo, o Itaú lidera a lista de reclamações no Procon no setor bancário. Esta é minha humilde contribuição para descer a lenha neste banco chato.

quinta-feira, julho 15, 2010

Um pequeno grande filme

É raro de acontecer, mas às vezes acontece. Você leva para casa um filme do qual nunca ouviu falar, só porque conhece um ou dois atores do elenco e não havia nada mais interessante à disposição. Está uma noite fria e chuvosa, a novela das oito já acabou e você não tem a mínima vontade de tirar o carro da garagem nem para ir ao aniversário da própria mãe. Está com preguiça de ligar para os amigos, já cansou de ficar na frente do computador e então, ao olhar de lado, vê esquecido num canto o tal filme para o qual você já torceu o nariz. Bom, não custa dar uma olhadinha de dez minutos, você pensa. E coloca o filme no DVD sem imaginar que está prestes a experimentar a uma hora e meia mais bacana dos últimos dias.

O filme em questão é Eu e Orson Welles, do diretor Richard Linklater, o que para mim não quis dizer muita coisa, pois sou péssimo para guardar nomes de diretor. Fui pesquisar e vi que ele já tinha feito Antes do Pôr-do-Sol e O Homem Duplo. Talvez eu esteja sendo otimista demais, mas, na minha opinião, trata-se do pequeno grande filme mais simpático do ano. É a história de um estudante nova-iorquino de 17 anos, ator e músico promissor, que consegue de maneira insólita um papel na montagem de Júlio Cesar, de Shakespeare, que Orson Welles, então com pouco mais de 20 anos, está dirigindo no decadente teatro Mercury, em Nova York.

Grande parte do filme transcorre durante os ensaios da peça – em que o gigantesco ego de Orson Welles pisoteia um time de atores tão esforçados quanto medrosos. Não fui adiante com a pesquisa, mas acredito que o filme é baseado em uma história real, tem todo o jeitão. Sedutor, mulherengo, arrogante e absurdamente talentoso, Welles é aquele cara que todos odeiam, mas de quem querem ficar perto porque sabem que alguma coisa muito boa ele tem para ensinar. Às vésperas da estreia do espetáculo, tensos e inseguros, os personagens de Welles e do jovem ator ainda encontram tempo para se apaixonar pela mesma mulher, a belíssima Sonja, secretária do teatro vivida pela atriz Claire Danes, que por sua vez está muito mais interessada em conhecer o poderosíssimo David O. Selznick, que está fechando o elenco para as filmagens de ...E O Vento Levou.

Para quem curte cinema, teatro e literatura, o filme é tão bacana quanto um happy hour ao lado de amigos queridos. Não tem assim a força de uma baladona, mas a gente volta para casa muito mais feliz.

segunda-feira, julho 12, 2010

Desculpem o nosso atraso

Vejo o goleiro Bruno lendo a bíblia na cela de um presídio mineiro. Me vem à lembrança a imagem do casal Nardoni também com a bíblia nas mãos numa penitenciária paulista. Concluo que a bíblia é um livro que chega um pouco tarde aos lugares em que deveria chegar. Se a houvessem lido um pouco antes, talvez Bruno e o casal Nardoni não tivessem feito o que são acusados de fazer. Alexandre e Ana Carolina Jatobá haviam rompido, para mim, a barreira do inominável. Nunca consegui visualizar a totalidade da barbárie pela qual eles foram julgados e condenados. A cena, na minha imaginação, termina no momento em que Alexandre teria carregado a filha, já inconsciente, até a janela. O que veio depois eu consigo ler e mesmo assistir nas reconstituições feitas pela polícia. Mas não consigo imaginar. Existe em mim um freio mental – criado talvez mais pela covardia do que pela nobreza – que me impede de produzir tais imagens na cabeça. Simplesmente me sinto incapaz de imaginar um pai soltando uma garotinha de cinco anos da janela do sexto andar de um edifício. Sou capaz até de escrever, mas não de visualizar. Agora, no caso da ex-modelo Eliza, ocorre o mesmo. Minha imaginação, com muito custo, vai até o momento em que ela é morta por asfixia por um dos capangas do goleiro. A sequencia de horror que irá terminar num canil de rotweilers também não se processa na minha imaginação. Quando a gente achava que Alexandre Nardoni havia atingido uma marca inigualável na competição da maldade humana, vem alguém e quebra seu recorde.

Vejo também, em prantos, a mãe de Eliza diante das câmeras de televisão. Algo muito conservador em mim, uma força retrógrada e reacionária que às vezes me assola – como o vilão Mr. Hyde assolava o doutor Jekyll, já que O Médico e o Monstro está na moda – me faz lembrar que esta mãe agora banhada em lágrimas abandonou Eliza quando ela tinha poucos dias de vida, talvez meses. Não sei qual foi o motivo deste abandono, e eu não teria a mais remota condição de julgar esta mulher. Mas é que eu não consigo afastar um pensamento daninho. A exemplo do que ocorreu com a bíblia de Bruno, eu tenho a impressão (vejam bem, o termo é impressão) de que as lágrimas da mãe de Eliza também chegaram atrasadas vários anos. Olho para ela e, antes de enxergar a mãe da filha morta, eu enxergo a mãe da filha abandonada. Paciência.

E vejo, ainda, as ações espetaculares promovidas pelas polícias do Rio de Janeiro e de Minas Gerais para solucionar o assassinato da ex-modelo. São imagens que levam ao deleite as câmeras do Jornal Nacional. E, como no caso da bíblia e das lágrimas, também me pergunto se nada poderia ter sido feito um pouco antes, quando Eloíza denunciou o goleiro por agressões, ameaças e indução ao aborto. Somente agora, oito meses depois de a modelo ter oferecido uma prova de urina ao Instituto Médico Legal, sai o resultado confirmando a presença de substâncias abortivas no material que ela entregou. Tudo me soa atrasado, criminoso e inconseqüente em relação à vida de uma jovem – até o momento em que as câmeras de tevê são ligadas. Daí surgem a bíblia, as lágrimas e as buscas. Eliza, mesmo, esta não surge mais.

Para terminar, vale o registro da dupla alegria que a Espanha nos ofereceu neste fim de semana. A primeira, pela vitória na Copa; a segunda, por ter dado asilo aos presos políticos que Cuba começou a libertar. Mais de 60 presos (incluindo aí os familiares) devem chegar a Madri nas próximas horas. Faz um tempinho que apenas dois, somente dois, atletas do boxe haviam pedido asilo político para o presidente Lula. Mais do que depressa, ele despachou os dois de volta para a formosa ilha de Fidel. Que lição a Espanha está nos dando, no campo do futebol e no das relações internacionais. Já que está bem velhinho para aprender a primeira lição, Lula poderia, ao menos, se esforçar para aprender a segunda.

segunda-feira, julho 05, 2010

Vrummmmmmmmmmm

Primeira marcha: há pouco mais de um ano, quando a Lei Seca entrou em vigor, escrevi um post um pouco irritado aqui. Se não me engano, a lei entrou em operação num fim de semana. No primeiro domingo de vigência da lei, me lembro de ter ido com dois amigos jantar no restaurante Mestiço, numa travessa da Rua da Consolação. Pedi uma caipirinha de frutas vermelhas (na época eu não sabia que caipirinha de frutas vermelhas não é bebida de homem, me contaram algum tempo depois) e um chope. Quando terminou o jantar, um dos amigos, que mora em Pinheiros, me pediu uma carona. Eu sabia que, naquela noite, a cidade estaria infestada de blitze da Lei Seca e que, se fosse parado no caminho, poderia perder a carteira de habilitação por causa da minha caipirinha boiola e do chopinho. Dirigi com tanto receio e preocupação como se estivesse transportando um cadáver no porta-malas. Foi sobre isso que falei naquele post. Agora a lei está completando um ano e a fiscalização voltou com tudo. Sempre que estou voltando para casa enfrento congestionamentos na avenida Doutor Arnaldo , causados pela fiscalização. Respeito a lei, mas confesso que não entendo algumas coisas. Por exemplo: o motorista de uma Kombi, dirigindo completamente embriagado, atropelou e matou três pessoas na Rodovia dos Imigrantes neste fim de semana. Conduzido à delegacia, ele pagou uma fiança de R$ 1,2 mil e foi solto imediatamente, como se tivesse passado por cima de uma garrafa pet jogada na pista. Não parece estranho uma lei tão severa que coloca na rua um motorista ainda embriagado que acabou de assassinar três pessoas? Com uma fiança de R$ 1,2 mil fica tudo certo?

Segunda marcha: alguém já tentou parar o carro nas imediações da Faap? Eu já, e confesso que é impossível. Há uma legião de flanelinhas atuando ali. Eles colocam cones no meio-fio para reservar as vagas na rua para os estudantes da faculdade. Uma tarde dessas, parei o carro numa dessas vagas. O flanelinha veio feito um louco pra cima de mim, perguntando quanto tempo eu ocuparia a vaga, já que ela estava reservada para um estudante. Respondi que não sabia e fui embora. Quando voltei, ele tinha entortado completamente a placa dianteira do meu carro. Será que ninguém da CET nunca viu esta barbaridade que os flanelinhas fazem ao lado da Faap, sob as barbas de todo mundo? Descobri, depois, que para reservar as vagas, eles recebem por mês dos estudantes, como se fossem donos de um estacionamento. Fico pensando se eles, os flanelinhas, não racham a grana com quem deveria investigar e punir esta atividade ilegal numa das regiões mais visadas da cidade.

Terceira marcha: o único lugar em que ouço música é no carro. Vá entender. Mas não tenho o hábito de ouvir música em casa. Eu só consigo trabalhar no mais absoluto silêncio. O aparelho de som aqui de casa só funciona quando vem alguém me visitar – daí é legal colocar uma musiquinha. É por isso que, quando descubro um CD interessante, aumenta meu prazer de dirigir. No momento, estou ouvindo um CD antigo, chamado 20th. Century Blues, da genial Marianne Faithfull. Eu tenho este CD há pelo menos dez anos, mas havia me esquecido completamente dele. Esta semana, revirando umas gavetas, eu o encontrei e corri no carro para ouvir. Desde então, dirigir voltou a ser um imenso prazer. Ela tem uma versão de um clássico chamado Boulevard of Broken Dreams que é de chorar. Aliás, o disco todo é de chorar. Coloco o CD pra tocar, dou partida e, como raramente acontece, não tenho vontade de chegar a lugar algum enquanto não termina a última canção. Apenas vou indo, vou indo... Até que um dia a gente chega a algum lugar.