segunda-feira, abril 30, 2007
Balu num céu de girassóis...
Como um exemplar de brasileiro típico, deixei para ver no último dia de temporada o espetáculo Adubo, Ou a Sutil Arte de Escoar Pelo Ralo, do grupo Tucan, de Brasília. O folheto da peça, de um indiscutível mau gosto, não traduz a beleza, o lirismo e o impacto deste trabalho - desde já uma das melhores coisas de 2007 nos palcos da cidade. Adubo é um espetáculo que fala da morte de maneira obsessiva, por meio de colagens de textos, narrativas entrecortadas, cenas curtas e um ritmo que às vezes lembra um videoclipe. E que consegue uma proeza invejável: ao falar da morte, a paeça parece despertar um interesse incontrolável pela vida. Difícil apontar algum elemento que se sobressaia nesta montagem tão equilibrada: a direção é primorosa, o texto é de uma qualidade cada vez mais rara nos palcos e o elenco, bem, o elenco é um caso à parte: quatro atores habilidosos, que trafegam pela comédia, pela farsa, pelo drama, pelo musical e até pela tragédia. Sem um tropeço, sem um deslize, com a competência de músicos clássicos diante de uma partitura habilmente ensaiada. Adubo é um desses espetáculos que têm a força de empurrar o teatro um pouco acima e além do terreno mais ou menos seguro onde estamos acostumados a trafegar. Sem grandes recursos cênicos - o elemento mais eclético no palco é uma lousa em que os atores vão desenhando os cenários - Adubo é a prova de que o triplé texto-elenco-direção sobrevive ainda como a mais prazerosa equação teatral. A cena final, em que Balu, o cachorrinho atropelado no início do espetáculo revela que existe, sim, vida após a morte, e que nesta vida há girassóis amarelos - já entrou, sem exagero, para a história do moderno teatro brasileiro. É para ver e rever várias vezes - se eu não tivesse deixado para o último dia, claro.
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4 comentários:
Realmente Adubo é um espetáculo excepcional, daqueles que não deviam nunca sair de cartaz. Ou ao menos ficar muito mais tempo do que a pequena temporada que eles ficaram. Vi duas vezes em uma semana, e sinto falta de não ter visto mais vezes... Os atores possuem uma performance corporal fantástica, um timing perfeito. Realmente, um espetáculo irretocável. Vida longa a Balu!
Oi, Maurício, o espetáculo é o máximo mesmo, né? Estou com ele na cabeça o dia inteiro. E obrigado por corrigir o nome do cachorro, tinha escrito errado. Super abraço.
Eu sou ator e um dos criadores da peça e fico muito feliz de ler seus comentários. Obrigado.
Sobre a arte, eu tenho de dizer que tivemos de modificar a arte original feita por Welder Rodrigues, por uma questão simples...
os restaurantes não permitiam panfletos nem cartazes em seus ambientes.
Mas nós gostamos muito da imagem do cachorrinho atropelado. Ela não vende bem a peça, mas é bastante representativa para nós.
Pedro Martins - o careca
ôba, valeu pela resposta. fico muito feliz que o comentário tenha chegado até vocês. Parabéns pelo trabalho e um grande abraço.
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