Passei pela região da Faap, em Higienópolis, hoje na hora do almoço. O trânsito estava horrível: tudo parado ao redor da faculdade. Pensei que o motivo daquele caos fosse a volta das aulas. Mas, ao chegar mais perto, vi que não era só isso: centenas de calouros, jovens da classe média alta, de belos rostos e um sorriso de uns 52 dentes, se espalhavam por todas as esquinas pedindo uma gorjeta aos motoristas. Na região da PUC, não muito longe dali, o cenário costuma ser o mesmo: calouros cruzando as ruas com moedinhas e notas miúdas nas mãos para entregar aos veteranos – uma performance em que se torna difícil distinguir qual dos dois lados é o mais idiota: se o dos calouros, obrigados a mendigar com seus jeans da Diesel nos semáforos, ou o dos veteranos, uma espécie de contadores da miséria, que na falta de coisa melhor a fazer na vida, devem ficar imaginando quantos copos de cachaça será possível comprar com tantas moedinhas. Não sei qual é o destino que os estudantes darão ao dinheiro arrecadado nas ruas destes bairros nobres da cidade – eu gostaria de acreditar que a quantia seria doada a alguma instituição de caridade ou usada na compra de equipamento escolar. Mas quando a gente repara no movimento dos botecos ao lado destas faculdades, fica fácil imaginar que tudo acaba em pinga.
Sei que há exceções, mas a maioria dos trotes continua sendo um ritual de imbecilidade. Todos os anos vemos casos de jovens feridos por tesouras, com a pele queimada por tinta ou algum produto químico ou, em casos mais graves, de calouros mortos por traumatismo ou afogamento. E outros casos, incontáveis, de jovens que se recusam a voltar à faculdade em função da carga de violência ou humilhação com que foram recepcionados por alunos mais velhos. Sei que os estudantes podem dizer: pô, faz parte da nossa ideia de socialização, é o momento de celebrar esta nova fase na vida dos jovens. Sei, conta outra...Ainda acho que é uma semana dedicada às formas mais primárias do sadismo. Isso é o que você merece por desejar competir comigo no mercado de trabalho – devem pensar os veteranos, enquanto transformam os calouros em uns zumbis de várias cores.
Aqueles jovens da Faap me impressionam especialmente. Hoje eles estão com os rostos e cabelos empapuçados de tinta, com as camisetas rasgadas e um certo ar de aventura nos rostos, enquanto experimentam, por um ou dois dias na vida, a sensação de ser um mendigo fashion. Sabemos que, na semana que vem, já inseridos em seu habitat natural, grande parte deles chegará à faculdade em seus carros importados, alguns com motorista e segurança. Se eles querem realmente fazer um trote inteligente e original, que tragam dinheiro trocado de suas próprias casas, em notas de um, e distribuam aos motoristas obrigados a perder tanto tempo no trânsito. Parece mais justo, mais politicamente correto e, acima de tudo, menos hipócrita. Tirando os veteranos, alijados de sua comissão, a cidade inteira aplaudiria este trote.
quinta-feira, fevereiro 05, 2009
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6 comentários:
Sempre odiei os trotes nas faculdades, pois acabam mesmo em cerveja e pinga nos botecos, além de uma violência boba e gratuita. Hoje temos alguns trotes inteligentes com doação de sangue e ajuda comunitária, entre outros engajamentos, mas já vi coisa horripilante, principalmente nas faculdades de medicina (os mais cheios de dinheiro e mais violentos). As reitorias deveriam coibir esse abuso sem fundamento. Para mim trote não é integração, pois encher a cara nos bares não vai fortalecer nenhum vínculo verdadeiro de amizade.
Concordo plenamente!! Não tem coisa mais idiota que calouro pedindo dinheiro no farol. Passei pela mesma situação em Higienópolis e juro que me veio a cabeça a condição social dos pedintes calouros e imaginei "Não seria mais fácial cada um trazer trocado ums R$ 30,00 e fazer de conta que arrecadou em vez de tumultuar o trânsito e encher a paciência dos motoristas?".
Gosto muito do seu blog, sempre passo por aqui
Sil
Oi, Sil, muito obrigado pela visita. Sei que a gente vive numa cidade grande e o trânsito maluco é parte do preço que a gente paga. Mas ver alunos da Faap atrapalhando ainda mais o trânsito porque estão nas ruas pedindo dinheiro é de tirar a paciência mesmo.
Oi, Fred. Pois é, pra mim os trotes sempre trouxeram algo de antipático, e fico feliz que algumas universidades estejam promovendo formas mais civilizadas de receber os alunos. Vamos torcer para que esta moda pegue, né? abração
Fiz esse tipo de trote quando entrei na faculdade, me senti um tanto idiota sem sentido. Um tipo de constrangimento talvez resultante da sobriedade no momento da mendigância. Consegui umas moedas e fui pra casa sem passar no bar, e não fez a mínima falta.
Descobri teu blog agora! Gostei muito!
Estava pesquisando teu email para te passar um link e caí aqui.
Se quiser me passar: natysimon@hotmail.com
Um beijo
Nataly (da Sumaré Sp.)
Oi, Nataly, surpresa boa te encontrar po aqui! Cadê você, tá dando um tempinho na academia?
beijão
sérgio
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