É engraçado notar como a vida traz algumas compensações. Fui ver o show de Marina Lima no Sesc Pompéia, no feriado da quinta-feira. Marina é uma das cantoras mais legais que a gente tem - aquela voz meio rouca de quem acabou de acordar feliz, a interpretação precisa e sem grandes floreios dramáticos, o figurino de quem está sempre pronto para uma baladinha, e não para uma noite de gala, um modo contemporâneo de ver a vida, expresso em quase todas as canções que compõe, e uma habilidade rara de combinar o que existe melhor no Rio e em São Paulo: a carioca branquinha que traz o frescor de quem vive de frente para o mar aliado ao jeitão cool e um pouco melancólico que só a noite de São Paulo é capaz de propiciar. Resumindo: uma cantora que nasceu e continua moderna.
Dizem que no fim dos anos 90 Marina perdeu a voz, roubada por uma depressão profunda. Confesso que não acompanhei tanto a trajetória de Marina neste período: minha cabeça ainda vivia ligada em canções como À Francesa, Grávida e Fullgas. Continuei gostando de Marina, mas a uma certa distância. Soube que ela faz vários shows no Baretto, mas nunca tive cacife para frequentar estes botecões de alto luxo. Então, o show do Sesc Pompéia teve o sabor de um esperado reencontro. Talvez Marina, no momento, não seja mesmo a cantora que um dia foi. Um grande amigo diz que hoje ela declama muitíssimo bem - e pode ser que ele esteja certo.
Todos os antigos sucessos de Marina estão no show, que pode ser visto até este domingo, dia quatro. E mais uma coisinha ou outra que ela andou compondo ultimamente. Mas, se Marina realmente perdeu um pouco da voz, ela ganhou uma outra coisa que não tinha, ao menos não na quantidade que exibe agora: carisma. Marina se tornou uma entertainer fascinante: brinca com a platéia como nunca brincou antes, conta histórias, conversa, fala dos pais que nasceram no Piauí, do irmão Antonio Cícero que esconde seu lado romântico atrás da poesia e da filosofia, de sua rotina de compositora, de seu apego aos ritmos nordestinos e de sua relação com a vida. O rock nacional ganhou, com Marina, um mestre de cerimônias sexy e cativante. Ouvir a Marina que fala é tão bom quanto ouvir a Marina que cantava um pouco melhor. Se sua voz diminuiu, sua timidez também. Não sei se o ofício se tornou mais fácil para ela e nem sei se era isso que ela esperava da vida ao dobrar os 50 anos. Não importa: ela continua linda, gostosa, sedutora e, pela reação do auditório que lotou o Sesc Pompéia, completamente venerada pelo seu público.
Neste momento em que todo mundo diz que é preciso se reinventar, Marina mais uma vez foi pioneira. Ela se reinventou com o pouco de voz que lhe restou e conseguiu uma proeza rara em se tratando de uma cantora: talvez não consiga mesmo cantar tão bem como antigamente. Porém, nunca esteve tão próxima de seu público e nem tão calorosa. A falta da voz revelou a dimensão humana da artista. Repito: não sei se ela está mais feliz agora. Mas pra gente nada mudou: Marina continua dando o que a gente sempre quis e esperou dela. O que mais um artista pode desejar?
sexta-feira, maio 02, 2008
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Um comentário:
"Hoje eu não quero mais me machucar/
Hoje eu não quero me perder,/Hoje eu não deixo mais nada importar,/A não ser você"
O trecho de uma das canções de Marina mostra o tom preocupado com a paixão, com a mensagem, com a vida, com o amor...Estamos sentindo isso cada vez mais forte em seus shows.
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