domingo, março 30, 2008

Despachante emocional

Um dia desses, sem muito o que fazer, me peguei olhando a lista de aprovados no vestibular de uma dessas grandes universidades. O que me chamou a atenção não foi o nome dos calouros (acho que não tenho mais amigos em idade de vestibular), mas a quantidade de novos cursos que na minha época de faculdade ainda nem existiam. Cursos ligados à pesquisa genética, à internet, ao meio ambiente, à política externa e a outros tantos assuntos que vêm ganhando espaço nos últimos anos. Me lembrei do estranhamento que eu provocava nos amigos quando dizia que ia prestar vestibular para jornalismo, lá nos anos 80. Há 20 anos isso era um pouco exótico - hoje jornalismo é a coisa mais carne de vaca que existe.

Faço esta pequena introdução aqui porque, após ler aquele caderno de vestibulares, fiquei com um desejo imenso de ter encontrado ali, entre as novas profissões, algum curso do tipo despachante emocional. O título seria este mesmo, despachante, e não consultor, porque despachante parece resolver tudo um pouquinho mais rápido do que os consultores. O esquema funcionaria assim: a gente iria até o despachante emocional e levaria uma cópia do RG, outra do CIC, um comprovante de endereço (este detalhe é importante, porque alguns problemas têm a ver com o lugar em que a gente vive) e uma foto 3x4 com menos de um ano de validade - não precisa estar de paletó. Junto com todos estes documentos, a gente entregaria um relatório especificando, no máximo em 20 linhas, qual é o grande caroço que está parado na nossa garganta. Pode ser um amor não correspondido, uma dúvida sobre trocar ou não de emprego, uma questão existencial, um dilema se a gente deve ligar para aquele amigo com quem a gente anda meio brigado, enfim, qualquer coisa - desde que seja cabeluda o suficiente pra gente ter muita vontade de tirar da frente. Um daqueles problemas que, diante do impasse, a gente chega a desejar muito que houvesse alguém para resolver tudo pra gente - e que esta resolução, em pouco tempo, se mostraria a coisa mais acertada que a gente poderia ter feito. Ou seja, um trabalho para o despachante emocional.

E então, dali a três dias, a gente voltaria ao escritório dele. Ou seria melhor chamar de consultório? E ele, ao nos ver no balcão, abriria um sorriso nos lábios e diria sim: "seu problema já está resolvido. Deu um pouco de trabalho, mas está tudo certo". E então, num relatório também de 20 linhas, com carimbo do cartório e firma reconhecida (neste época de falsos profetas, é sempre bom a gente se precaver), estaria tudo lá, tim-tim por tim-tim, os passos que a gente deveria tomar para resolver o problema e voltar a ser feliz. Ele ainda nos daria um tapinha nas costas, diria que estaria sempre ali para qualquer emergência e que a gente só precisava, agora, acertar ali no caixa. Ele aceitaria cheques, cartão de crédito e rede shop. Como a gente deve ter uma cara mais ou menos honesta, ele ainda parcelaria em três vezes sem juros...

No caminho de casa, já sem aquele peso nas costas, a gente tomaria um sorvete, prestaria atenção em várias coisas belas nas quais a gente nunca repara, não reclamaria do trânsito e nem da bateria do celular que acabou justo agora, e ainda começaria a desconfiar, assim de leve, que a vida vale muito a pena... E, só por precaução, já que estes momentos muito felizes têm a mania de ir embora logo, a gente olharia no bolso para se certificar de que o cartão do despachante emocional estava bem guardadinho ali...

2 comentários:

alberto disse...

se vc conhecer algum despachante emocional, tou precisando. adorei o texto. bj

Anônimo disse...

sono blog. uaaaaahhhhhhhh