Depois de assistir, na noite de domingo, ao mais recente filme do diretor inglês Mike Leigh, a comédia Simplesmente Feliz, cheguei à triste conclusão que deve ser mais fácil ter como companhia amigos preocupados ou mesmo levemente deprimidos do que ser obrigado a passar algumas horas ao lado de alguém como a professora primária Poppy, interpretada no filme com muita eficiência pela premiada atriz Sally Hawkins. Nada parece estar ruim para Poppy, mesmo quando as coisas não vão bem. Ela desfila pelas ruas de Londres coberta por um figurino tropicalista e distribuindo sorrisos aos cachorros, aos mendigos, aos vendedores mal humorados e a quem mais cruzar o seu caminho de cara amarrada.
Todo mundo já deve ter visto algumas pessoas ostentando no peito um button onde se lê: quer emagrecer, me pergunte como. Pois Poppy é como um gigantesco e animado button em forma de gente a perguntar: quer ser feliz, me pergunte como. O grande problema de Poppy é sua insistência em animar o dia daqueles que parecem viver muito bem debaixo de nuvens escuras. Acredito que até a rabugice alheia merece respeito quando ela não é gratuita. A felicidade de Poppy é, antes de mais nada, invasiva. Em resumo, trata-se de um personagem chato, muito chato, um manual de auto-ajuda que insiste em se revelar mesmo à nossa revelia.
Saí do filme com a convicção de que tudo que chega até nós em demasia enjoa depressa. Ainda que seja a alegria. Sei que ninguém gosta de ter por perto um amigo eternamente baixo astral e reclamão. Mas a incurável felicidade de Poppy, que ela se esforça por transformar em algo contagioso, também não é fácil de tolerar. Diretor tarimbadíssimo, Mike Leigh não escorrega no clichê de fazer com que os outros personagens do filme perguntem a Poppy como ela pode ser tão feliz em um mundo aparentemente tão hostil. O problema não está em contrapor a felicidade de Poppy às crianças que passam fome ou aos inocentes que morrem nas guerras. O personagem tem algo a seu favor: ela é feliz independente do mundo em que vive. Ou apesar do mundo em que vive. Em compensação, há algo de muito previsível em sua personalidade também: ela sempre vai estar bem, ainda que o dinheiro acabe, a solidão avance e a idade comece a apresentar suas inevitáveis faturas.
Em resumo: deve ser chato conviver com Poppy não por causa de sua previsibilidade, sua insistência em fazer trocadilhos e piadas infantis, seu sorriso cimentado no rosto e sua beatitude perigosa. Deve ser chato conviver com Poppy porque, antes de qualquer coisa, ela não é humana. Uma das coisas legais dos amigos, imagino eu, é a gente não ter a certeza de como eles vão estar na manhã seguinte, o que sempre exige de nós criatividade, atenção redobrada e muito, muito carinho com eles. Caso contrário, a gente combinaria de encontrar com eles na igreja, e não nos botecos.
segunda-feira, março 30, 2009
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Um comentário:
Deve ser a química cerebral. Algumas pessoas sao por natureza muuuuito alegres, outras tristinhas. Os dois extremos sao cansativos.
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