Como não tenho visto quase nada das Olimpíadas, confesso que ando meio sem assunto nos últimos dias. Chego à academia de ginástica por volta das dez da manhã e todo mundo está comentando o resultado de alguma competição que eu nem sabia que tinha sido disputada. Os instrutores dão um jeitinho, a cada dois minutos, de correr até o computador instalado no escritório para acompanhar os tempos, os fracassos e as glórias de uma porção de atletas que eu, humildemente, assumo que nunca ouvi falar. E eu fico lá, feliz da vida esquecido num canto, olhando para a esteira, os pedais da bicicleta e um ou outro halteres sem a mínima intenção de superar ninguém no que quer que seja.
E por falar em academia, aproveito para enviar um recado à legião de amigos que apostavam no meu sedentarismo eterno e irremediável: nesta quarta-feira, dia 20 de agosto, completei um ano de malhação quase diária. Não sei se alguma coisa em meu corpo melhorou, mas agora eu como meu brigadeiro e tomo meu potinho da Häagen Dasz sem aquela sensação de que estou transportando cocaína da Colômbia: as gordurinhas talvez não tenham ido todas embora, mas a culpa já foi. E isso foi a melhor coisa que a academia me trouxe. Se ainda não fiquei leve na cintura, minha cabeça anda que é uma pluma.
O que me irrita um pouco nestas Olimpíadas não é tanto o excesso de notícias sobre o evento, mas o tom ufanista com que a imprensa tenta nos convencer de que algo um pouco mais sério do que alguns milésimos de segundo está em jogo. Dorival Caymmi morreu no fim de semana e alguns sites da Internet insistiam em trazer como manchete o fato de uma atleta ter perdido a vara. Na minha cabeça, o país tinha perdido um dos seus compositores mais importantes, um homem que passou a vida a nos ensinar que o mar do Brasil não era apenas o mar do Leblon e que por trás de toda beleza do vaivém das ondas escondia-se uma melancolia sem fim. Havíamos perdido um homem que nos ensinou como podia ser elegante sentir alguma angústia num país tropical e chorar por algum amor perdido enquanto o barquinho vai e a tardinha cai. Mas, na cabeça de parte da imprensa, naquele dia havíamos perdido apenas uma vara.
Agora, insuportável mesmo é a quantidade de matérias, ao menos duas por dia em cada jornal grande, sobre o boom arquitetônico da China. Talvez eu esteja prestes a dizer uma grande besteira aqui, mas eu esperava um pouco mais de criatividade de uma civilização de cinco mil anos que, de repente, amanheceu endinheirada. Vejo todas as fotos daqueles edifícios novos e, se a legenda não me alertasse que se tratava de Pequim, eu facilmente diria que é Miami, Nova York, Tóquio ou qualquer outra metrópole do mundo. A impressão que tenho é de que a China está usando seus bilhões de dólares para se tornar parecida com alguma coisa que ela não é. O país está ficando com cara de alguma grande feira de arquitetura e hoje a vontade que eu tenho de conhecer a China é a mesma que tenho de passear pelo pavilhão de exposições do Anhembi: tudo me parece fake, repetitivo e com aquela sensação de que se a gente olhar por trás só vai encontrar etiqueta e uma indicação de “este lado para cima”.
A cobertura das Olimpíadas e do mega-crescimento chinês só reforça a minha tese pessoal de que o excesso mais afasta do que atrai. Houve uma época em que eu sentia uma vontade autêntica de conhecer a China – hoje o país ocupa, seguramente, um dos últimos postos na minha lista de lugares que ainda pretendo visitar. Quando me bater a vontade de alguma coisa daquele país, já decidi que vou almoçar num bufê por quilo de comida chinesa que fica ali na Rua Mourato Coelho: custa só 15 reais, a gente come à vontade, pode repetir a sobremesa e a dona ainda tenta falar português com um sotaque muito carregado. Sinto que é o mais perto que eu pretendo chegar da China nos próximos anos. Com a vantagem de ser muito mais barato também.
quarta-feira, agosto 20, 2008
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6 comentários:
Roveri,
Em que altura da Morato? Acho que esse bufet soa mais interessante - para não dizer mais viável - que uma viagem à China, a essa altura do campeonato.
Me solidarizo com você no que alguns chamariam de alienação. Não faço idéia do que está se passando por lá. Ouvi falar de tacos roubados, achei que havia a categoria golfe. Para você ver.
abraço,
Aimar
Sérgio, vamos ver se consigo postar... Agora fiz a tal conta, era isso! E eu já tinha, que vergonha.
É, também quero distância desta China, e da do início do século e da do meio pro fim e tb desta China ditatorial de dentes arreganhados; mas não dos chineses, dos bilhões que ainda sofrem, excluídos, nem dos gentis, nem dos que lutam por uma vida mais delicada.
A criatividade e individualidade foi por água abaixo na tal revolução cultural... mas que se ergam em idéias e novas imagens.
Ótimo comentário seu, a gente perdendo esta angustiosa delicadeza de sonora voz e brincada letra e o pessoal olhando sei lá o quê.
E o seu texto??? Tô esperando, de coleira.
E eu copiei um dos seus comentários maravilhosos pra eu degustar mais vezes.
bjim
Aimar e Valéria, meus queridos. Que delícia poder ligar o computador à meia-noite e meia, horário em que a gente só recebe spam, e dar de cara com o carinho de vocês por aqui.
Então, vamos ao dever de casa:
1) Aimar, o restaurante fica na Mourato entre a ARtur e a Teodoro Sampaio, do lado direito de quem vai para a Teodoro, antes de chegar no Pão de Açúcar. Mas chegue cedo: depois das 13h30 eles não repõem mais a comida....
2) Valéria, estou enviando o texto por e-mail. Beijão
Adorei , COMO SEMPRE , mais esse seu texto !!! Concordo com tudo que vc aqui expõe ... Também me sinto um ET quando se trata de esportes e fico feliz em saber que eu não sou o únco que não compartilha dessa alienação toda .
Até escrevi algo sobre isso em meu BLOG . O seu está linkado por lá . Espero que vc não se ofenda , rs.... http://olhardesoslaio.multiply.com
ABRAÇOS !
Alberico, meu querido. Muito obrigado por mais esta visita ao blog. Valeu demais pela força. Grande abraço. Roveri
Ai meu querido, então este corpinho delicioso é resultado da academia!? Parabéns, muuuito bom :) O importante continuar tentando...rs Beijos, ótimos textos.
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