quarta-feira, agosto 27, 2008

Com 200 pilas na bolso, mas entubado

O telefone toca por volta das quatro da tarde. Dou uma olhadinha naquele aparelhinho milagroso chamado ‘detecta” e não reconheço o número. Aquela série de “zeros” no final indicava que não era nenhum amigo ligando: devia ser do banco, da seguradora, algo do tipo. Atendi. Era um rapaz chamado James, que me chamou pelo nome completo. Pensei: roubada na certa.
Ele era da administradora do meu cartão de crédito e, logo após se apresentar, disse que estava ligando, em primeiro lugar, para me cumprimentar “pelo histórico de ótimo relacionamento que eu mantinha com a administradora do cartão”.

Eu disse que possuía aquele cartão há menos de dois meses, período em que paguei uma única fatura. Assim, minha ótima relação com o cartão de crédito estava ainda na fase do aperto de mão. Mas ele não se abalou. Como nenhum desses atendentes se abalam: você pode dizer que seu prédio está desabando, que você está com uma arma apontada para a cabeça ou que você nem é a pessoa que eles estão procurando pois nada disso faz diferença mesmo. A partir do momento em que eles ouvem “alô”, eles não conseguem parar até terminar tudo o que têm a dizer.

Pois bem, o James ligou para me oferecer uma espécie de seguro-saúde. Digo “uma espécie de” porque não era um seguro-saúde convencional, ele me explicou. Vou tentar reproduzir o diálogo.

- Senhor, o nosso cartão se associou a um grande banco nacional e agora está oferecendo ao senhor uma espécie de seguro-saúde que entra em vigor a partir da meia-noite de hoje...
- James, eu tento dizer, muito obrigado, mas eu já possuo seguro-saúde.
- Mas este é diferente, senhor – ele me explica. – Este começa a vigorar a partir da meia-noite de hoje. Se o senhor for internado, a cada dia no hospital o senhor irá receber cem reais, depositados em sua conta.
- Olha, James, não estou mesmo interessado.
James, é claro, não olha e nem ouve.
- No entanto, senhor, esta quantia de cem reais diários pode dobrar, isso mesmo, pode chegar a duzentos reais se a internação for na UTI.
- James, eu digo agora mais impaciente, é que eu não vejo o que fazer com duzentos reais por dia se eu estiver internado numa UTI. Acho que uma UTI é o último lugar em que eu vou poder gastar seus duzentos reais.
- O senhor costuma viajar para o Exterior?, ele me perguntou.
- Muito menos do que eu gostaria, eu disse.
- Porque este convênio também cobre viagens ao Exterior. Se o senhor precisar de internação lá fora, até o limite de....
Tentei, mais uma vez, argumentar que eu não queria mesmo dispor daquele serviço...
- Mas o senhor está recusando mesmo antes de saber o quanto custa, ele falou. Custa apenas 26 reais por mês e a partir da meia-noite de hoje, se o senhor for internado, vai receber cem reais por dia de internação, até o limite de....
- James, muito obrigado e tenha uma boa tarde.
- Duzentos reais em caso de UTI, senhor, a partir da meia-noite...
Desliguei o telefone e tudo me leva a crer que James demorou um tempão para perceber isso também.

4 comentários:

Lucianno Maza disse...

Sensacional Sergio!
Sempre passo por aqui, linkei no meu para não esquecer, e adoro os textos. Sou voyeur de blogs, nunca comento... rs
Mas saber através de você deste maravilhoso seguro-saúde me arrancou riso fácil.
"Como assim" R$100 por dia de internação ou R$200 em caso de UTI? É algum tipo de bônus, premiação ou o quê? rs
Não acredito que você perdeu esta oportunidade, não acredito!
Saudades suas.
Beijos

Só no blog disse...

Olha, se eu fizer este seguro, eu te chamo pra me visitar no hospital, tá bom? Daí a gente pega os 200 pilas e torra em cerveja lá no corredor, deve ser divertido! beijão

Viralata disse...

"James, é claro, não olha e nem ouve."
hauahauhauahauh!!!! é a melhor!!!! kkkkkkkkkkkkkk

Valéria Medeiros disse...

kkkkk! é, são treinados pra roubar nosso tempo e convencer de qualquer jeito! É uma retidão torta o que estes pobres funcionários têm que fazer pra sobreviver. É engraçado de ler, fico imaginando vc dizendo pra ele que não estaria interessado em ter 200 reais se estivesse na UTI, porque isso sai do parâmetro do cara. Mas deve ser tristerrível ter um emprego desses, ter que se sujeitar a isso, não deve ser fácil, eles devem respirar e...
bjim,
Valéria