sexta-feira, agosto 10, 2007

Barriga pra dentro - a missão

Fugi o quanto pude, até que hoje não deu mais: fui obrigado a fazer a avaliação física na academia de ginástica que freqüento há três semanas. Só tenho uma palavra para descrever a experiência: crueldade. Ou melhor, duas palavras: crueldade e masoquismo. Faz sete horas que a avaliação terminou e ainda sinto que preciso mergulhar numa piscina de lexotan e dormir até quarta-feira que vem. Explico as razões: primeiro, o professor faz uma série de perguntas fáceis de responder: sente alguma dor muscular, já foi operado, é sedentário, acredita que está acima do peso, está contente com o seu corpo, dorme bem, come bem... essas coisas todas. Esta parte eu tirei de letra: a resposta era sim para tudo que indicava problema e não para o resto. A tragédia, no entanto, estava apenas se anunciando.

"Tire a roupa", pediu o professor. "Preciso fotografá-lo em várias posições". "Para quê?", eu perguntei. "Para inserir as fotos num programa de computador e completar a avaliação". Juro que a gente precisa fazer de tudo para que este programa nunca caia em mãos erradas. A gente seria chantageado pelo resto da vida. Quando ele começou a colocar as fotos no computador, senti pena dele: era como tentar encaixar um quadro do Botero no David de Michelângelo. A gente começa a ver que a barriga está pra frente, as costas estão para trás, a musculatura da coxa está encurtada, a coluna está desalinhada... juro, sem exagero algum, que até minha orelha apareceu fora de esquadro. Sem falar nos pés, que, segundo ele, têm me conduzido por caminhos tortos há quatro décadas e eu nunca percebi. O programa traça umas linhas, espécie de meridiano, que sinalizam uma terra devastada. Sabem aquela sensação que às vezes a gente tem, de se sentir deslocado em uma festa? Então, eu estava completamente deslocado dentro do computador. Saí de lá achando que a gente só pára em pé e anda por um milagre divino.

Comecei a olhar de perto aquele programa e de repente veio uma alegria imensa, mas que durou pouco. "Olhe aqui", eu pedi ao professor, "aqui diz que eu sou uma pessoa magra, está escrito". "Nada disso", retrucou ele. "Quando existe uma porcentagem de gordura corporal acima do esperado, este dado não pode ser considerado. Ele não entra na avaliação". O que dizer de um programa de computador que desconsidera o único dado positivo que temos na vida? "O programa revela que você não É uma pessoa gorda. Você ESTÁ gordo nos lugares errados. É isso que o programa diz". Ah... entendi. Então ele me explicou que eu precisaria malhar muito, fazer muitos exercícios aeróbicos, começar uma dieta e puxar muito ferro para...tchan...tcha...tchan...tchan... ficar com o mesmo peso que tenho hoje - só que a gordura tem de dar lugar a músculos. Ou seja: a sensação que dá é que a gente precisa se vestir bem para ficar em casa. Daí ele me disse que esta troca de gordura por músculo representa qualidade de vida, melhora na auto-estima, condicionamento e mais um monte de coisas bacanas que eu já esqueci. Para mim, continua sendo trocar um Chuck Norris por um Arnold Schwarzenegger - mas se ele diz que é importante, vou acreditar. Afinal, já paguei seis meses adiantados mesmo...

Quando saí da avaliação, cruzei com a Cibele, uma das professoras mais simpáticas da academia. "Que cara é esta?', ela me perguntou. "Acabei de fazer minha avaliação física. Acho melhor eu acreditar em reencarnação. Tenho certeza de que, nesta vida, não dá mais tempo de eu me encaixar naquele programa"... Ela riu e fechou de maneira brilhante a minha triste manhã: "É, às vezes a gente precisa tomar um tapa na cara pra reagir, né"... Então ela sabia, todos sabiam que aquele programa de computador faz a gente se sentir uma daquelas mulheres de Picasso, irremediavelmente tortas para todo o sempre.

Saí da academia e aceitei o convite do meu amigo Marcelo Onaga pra almoçar. Comemos arroz, feijão, batata frita e, dane-se, um belo pedaço de lingüiça. Já que o computador fodeu comigo, eu precisava me vingar dele de alguma maneira. E nada melhor que uma bela lingüiçinha de porco pra gente sentir que a vida volta a sorrir... Dieta? Na segunda eu começo. E vou passar o fim de semana rezando para que um vírus bem gordo, torto e sedentário ataque aquele maldito programa de computador neste fim de semana....

11 comentários:

Barbara disse...

Ah Massa, eu também fiz essa avaliação física antes de começar o Pilates e fiquei desesperada! No meu caso,o efeito foi o contrário. Não é para rir não, porque o corpo quando é magro demais também é deprê! Fique bem feliz com suas gordurinhas.

Anônimo disse...

Olá, você é o Sérgio Roveri dramaturgo? Se sim, você deve ser amigo do Marcelo Onaga, né? Sou fã de vocês dois...

Kalau disse...

hahaha- estava aqui imaginando sua cara durante todo esse processo. Dá uma bela comédia essa avaliação *R Abs/Kalau

Anônimo disse...

"tudo vira bosta!"

Só no blog disse...

Kalau, se a peça sair, adivinhe de quem vai ser a trilha, hein?
Ismael, pior que no fundo é isso mesmo, né?
Bá, já me acostumei com minhas gordurinhas...as coisas vão fazendo parte da gente, né?
Lislane, eu não sou este Sérgio Roveri, não. E não conheço o Marcelo Onaga. O que ele faz?

Anônimo disse...

Sergio, o Onaga era transformista infantil em Tokyo - um dos melhores. Mas parece que perdeu o emprego depois que a Disney expandiu seus negócios por lá. Faz tempo que não o vejo, mas ouvi dizer que hoje em dia ele está trabalhando de massagista na Luisa Sato. E voce, o que faz então? um beijinho da Lis

Unknown disse...

Você está ótimo do jeito que está,danem-se essas máquinas e seus operadores malucos,querido.Mas que rendeu um texto muito engraçado,isso rendeu...rsrs.Beijooooos.

Só no blog disse...

Oi, Lislane, agora eu me lembrei, é isso mesmo. Depois que ele perdeu o emprego de transformista infantil em Tóquio, ele ainda ganhou a vida como treinador de tamagoshi em Hiroshima, lembra disso? E depois ele trabalhou como hostess numa boate nipo-gay da Liberdade, mas isso eu só ouvi falar, porque nunca frequentei. Depois eu falo um pouco do que eu ando fazendo, agora fiquei com vergonha....

Só no blog disse...

Patrícia, querida. Eu também fico rindo daquele teste e, no fundo, tudo serve pra gente se divertir e contar pros amigos depois, né? Beijão, querida.

Kalau disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Kalau disse...

Será um prazer musicar qualquer trabalho seu, gosto muito de seus textos . [ ]´s