Esta semana, durante um almoço, conversei com um amigo muito querido sobre um tema curioso: o boicote à felicidade. Experiente profissional da psicanálise, ele disse acreditar, por experiência de consultório, que da mesma maneira que existem pessoas hábeis em se afastar da dor, há aquelas que fazem de tudo para não permitir a chegada da felicidade. Por uma incapacidade de admitir um final feliz em suas histórias, elas colocam em prática algum mecanismo de defesa capaz de pôr tudo a perder: escolhem conscientemente as palavras mais ásperas, as atitudes mais grosseiras, o caminho mais tortuoso e a expressão mais hostil até que, a felicidade que chegava de mansinho na vida delas, se assuste e fuja na mesma hora. E se a felicidade insistir e não fugir delas, tudo bem também: elas saberão como fugir da felicidade. A conversa com o amigo termina por aqui. O que vêm a seguir são minhas divagações – e é bem provável que o amigo, se algum dia passar por aqui, nem concorde com elas.
O que eu sinto é que todo mundo já se encontrou, ao menos uma vez na vida (e seria ótimo se tivesse sido uma vez só) nesta situação: fugir com medo da alegria que um emprego novo, um amor, uma viagem ou uma aventura pudesse nos trazer. Colocamos nossos planos no papel e vemos que aquilo tem tudo para dar certo... a menos que nós não deixemos. E então nós não deixamos. Por comodismo, por medo ou, o que é um milhão de vezes pior, por não nos sentirmos merecedores ou dignos de um presente que a vida está prestes a nos dar. Como os presentes da vida não costumam ser gratuitos, talvez os rejeitemos por saber, de antemão, que em algum momento chegará a fatura.
O que me causa espanto, neste terreno, é constatar a nossa capacidade de reação diante da dor, da morte, do inevitável. Encontramos forças para reagir àquilo que nos faz mal e nos mostramos impressionantemente fracos e covardes quando somos obrigados a encarar a felicidade. Logo ela, que é tão mais frágil que o seu algoz. Às vezes, talvez como qualquer pessoa, eu me vejo tomando algumas atitudes que naquele momento não me farão feliz de modo algum. Mas eu levo a idéia adiante com a desculpa de que se trata de um mal necessário. Digo para mim mesmo: isso que estou fazendo agora está me deixando muito triste e contrariado, mas é algo que precisa ser feito, porque lá na frente eu vou me orgulhar desta minha força. É como os nossos pais, que depois de nos aplicar uma severa punição na infância, nos diziam que lá na frente nós iríamos agradecê-los por tantos tabefes e privações...
A gente cresce, se afasta dos pais mas continua a se tratar do mesmo modo: esbofeteamos a nossa alegria e o nosso desejo com a desculpa de que amanhã encontraremos uma explicação e uma recompensa para tanto desfalque. A cada dia eu tenho mais medo de que este amanhã nunca chegue. E mais medo ainda de que, caso este amanhã efetivamente chegar, ele não saiba mais identificar o que de nobre existe por debaixo de tantos hematomas que nós mesmos nos causamos.
sexta-feira, janeiro 09, 2009
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4 comentários:
eita... eu precisava ler isso...
ando com medo de 2009...
um beijo!
Oi, querida. Acho que você não é a única, viu... Todo mundo tá com um pouco de medo também, inclusive este que vos fala. Beijão
Começo de ano, grávida de 8 meses... Olá, meu nome é insegurança! E esse seu texto de certa forma me acalmou, até repassei para alguns amigos e todos aprovaram. Muito bom...
E feliz ano novo para vc!
Oi, Rê, brigadão pela visita e por indicar o blog. Valeu mesmo. Sérgio
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