Cansada de apenas imitar a arte, parece que a vida resolveu se antecipar a ela. Na próxima sexta-feira, dia 13, entra em cartaz o novo filme do cineasta M. Night Shyamalan, Fim dos Tempos, em que ele mostra um misterioso surto que leva as pessoas a cometer suicídio. De repente, do nada, gente com uma vida estável começa a se jogar dos prédios, a explodir a própria cabeça, a se atirar na frente dos carros. É um modismo macabro, este. Pois aqui, na nossa São Paulo que fica bem longe de Hollywood, também estamos diante de um modismo igualmente estranho: o de dirigir na contramão. Nas últimas semanas, a polícia registrou pelo menos dez casos de motoristas que, sem razão aparente, resolveram dar meia-volta com seus veículos e enfrentar alguns poucos quilômetros com o resto do mundo vindo na direção contrária.
O fenômeno começou com um jovem bancário que dirigiu na contramão por um tempão na rodovia Castelo Branco, até dar de cara com um caminhão que pôs fim à sua aventura e também à sua vida. O caso foi tão impactante e inédito que os jornais reproduziram, por meio de desenhos, minuto a minuto da trajetória tresloucada do motorista. Seus familiares foram entrevistados, falou-se em bebedeira, em depressão, em suicídio. O que ninguém sabia, até aquele momento, é que, ao dirigir alguns quilômetros na contramão, ele estava abrindo caminho para que outros tantos motoristas viessem atrás: jovens, senhoras mais idosas e homens de vida regrada que, cansados de seguir o fluxo, quiseram experimentar a aventura do sentido contrário.
Um dia, por falta de atenção, também dirigi na contramão por apenas uma quadra no bairro das Perdizes. Eu tinha saído da academia e, ao virar numa rua cujo nome não me lembro, o pneu da frente entrou com tudo num buraco imenso. Fiquei tão puto que acelerei para sair dali e virei na primeira esquina que encontrei. De repente, ao chegar num cruzamento, vi que o semáforo estava de costas para mim. Mas não vinha ninguém de lugar algum. Dei meia-volta e fui embora como se nada tivesse havido. Minha sorte é que eu estava num bairro tranquilo, numa manhã ainda mais tranquila, e não na rodovia dos Imigrantes ou na Castelo Branco. Esta minha imprudência renderia, no máximo, algumas ofensas e um ou outro dedo médio em riste.
Mas como explicar tantos casos de gente que resolveu entrar pela porta de saída? Seria apenas uma grande coincidência o fato de todos estes casos de gente guiando na contramão terem ocorrido praticamente no último mês? O que haveria em comum entre estes dez motoristas? Teriam ouvido alguma mensagem cósmica dizendo quem for brasileiro que me siga? Estariam a serviço da nova máfia do Detran? Declararam guerra ao espelhinho retrovisor? Sucumbiram à tentação dos 15 quilômetros de fama? Ou resolveram, metaforicamente, resgatar alguma coisa que ficou esquecida lá atrás? Seja lá qual for a explicação, é bom que estejamos atentos porque, a qualquer momento, pode surgir diante de nós alguém a 100 quilômetros por hora dizendo que resolveu voltar de repente porque as coisas andam feias um pouco mais à frente....
quarta-feira, junho 11, 2008
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