segunda-feira, agosto 30, 2010

Por um dia de Stallone

A cada vez mais eu tenho certeza de que não poderia ser um cara fortão. Se fosse, acho que eu viveria brigando. Pois nunca vi uma época em que a delicadeza estivesse tão fora de moda. Tenho alguns amigos fortões, como o José Roberto Jardim e o Nicolas Trevijano que, além de atores, são campeões de kung-fu. Campeões mesmo, com troféu em casa e uma flexibilidade corporal que lhes permite passar o cotonete usando os dedos dos pés. Sempre admirei a força e a destreza dos dois – não por que eu seja um amante das lutas marciais. Mas porque eu imagino como seria bom encarar o barnabé que está conversando no cinema e mandar ele calar a boca. Como eu não sou nem o Nico e nem o Zé, eu faço uma cara feia para o barnabé. Se ele não parar de falar, faço outra cara feia e dou uma bufada. Se mesmo assim ele continuar falando, eu levanto e mudo de lugar – porque sei que dentista está caro e deve ser muito humilhante apanhar no cinema, ainda mais se a gente está com a razão. O bom do Nico e do Zé é que eles têm coração de manteiga e paciência de mãe – justamente por serem fortes e saberem disso, evitam brigar. Nunca vi nenhum dos dois metidos em qualquer confusão. Acho que, enquanto desenvolviam os bíceps, eles cuidavam também de estimular a paciência. Eu já estou numa fase bem distinta: não desenvolvi os músculos e estou perdendo a paciência a cada dia.

Se eu fosse um cara fortão, juro que eu encarava. Mas a última briga que tive foi aos 11 anos, no quarto ano primário. Dei uma guarda-chuvada na cabeça de um menino chamado Paulo, que tinha me dado um pontapé na bunda. E terminou aí a nossa contenda. Daquele dia até hoje, só dei um soco. E foi no computador, num dia em que a energia caiu e eu não tinha salvado nada do que tinha escrito. Além de perder tudo, fiquei com o maior medo de ter quebrado o computador. Felizmente, minha falta de força no muque preservou todas as plaquinhas do meu computador.

Não sou adepto da violência, não mesmo. Mas acho que algumas pessoas precisam levar uns sopapos para aprender a viver em sociedade. Na sexta-feira de manhã, em Higienópolis, um aluno de auto-escola parou o carro para que eu e uma babá com duas crianças, uma no colo e outra no carrinho, atravessássemos a rua na faixa de pedestre. Nada mais justo, correto e esperado da parte de um motorista, ainda mais em treinamento. Pois não é que um espírito de porco que estava no carro de trás começou a buzinar feito um louco e a ofender o aluno da auto-escola, só porque ele tinha parado pra gente cruzar a rua na faixa de pedestre? Não dá vontade de ir lá, pegar o cara pelos colarinhos e mandar ele enfiar a buzina no rabo? Mas como a gente não quer confusão, atravessa a rua correndo e fica quieto.
Outro dia, numa sessão lotada do shopping Frei Caneca, um carinha conversou com a namorada, em voz alta, o filme inteiro. Atendeu a três ligações do celular e fez outras duas. Pedi por favor para ele deixar a gente ver o filme. Pedi três vezes. Ele não deu a mínima. Como o cinema estava lotado, não adiantava bufar, fazer cara feia e mudar de lugar. Engoli em seco e tentei acompanhar o filme como se o carinha estivesse na sala da casa dele e eu fosse um convidado indesejável. Então eu me pergunto por que é a gente que sempre tem de ceder?

Contei este caso para uma amiga e disse para ela que, se eu fosse um cara fortão, teria dado um bofete na cara daquele desgraçado. Porque eu acredito que um cara, que apanha num cinema na frente da namorada, vai pensar duas vezes antes de abrir a boca no próximo filme. Minha amiga ficou horrorizada com a minha teoria. Ela disse que violência gera violência, que ele podia ter uma arma no carro, sair do cinema na mesma hora e chamar uns amigos para me descer o cacete no fim do filme ou tomar qualquer outra atitude que viesse a me prejudicar. “Esses caras não têm nada a perder”, ela me disse. “O melhor que a gente tem a fazer e desviar e ficar quieto”.

Concordo com ela. Mas que eu tive uma vontade quase incontrolável de dar uns cola-brinco naquele escroto, ah, isso eu tive. Do mesmo jeito que quis encher de porrada o motorista de Higienópolis. Mas de nada adianta. Tenho certeza de que hoje o carinha do cinema continua atazanando a vida de quem se sentar ao lado dele, do mesmo modo que o motorista de Higienópolis segue buzinando e ofendendo quem é educado no trânsito.

E a gente, que procura ser um pouco decente e educado, só se ferra, em todas as ocasiões. É a gente que tem de mudar de lugar, é a gente que tem de pedir por favor, é a gente que eternamente faz o papel do palhaço. Não estranhem se um dia me virem entrando numa academia de boxe. O mundo tá ficando tão hostil que é bom que algumas pessoas saibam que, depois do terceiro por favor, a gente também é capaz de se fazer ouvir com o punho fechado.

6 comentários:

Mário Viana disse...

Nossa, Serginho, ainda bem q sua inspiração voltou animada. E traduzindo o que nós, pacifistas por falta de muque, pensamos.
Confesso ter vontade de dar uns sopapinhos, de leve. E de dirigir um desses carros jamesbondianos, só pra amassar carro de babaca, que para em fila dupla, na porta da sua garagem ou lugares afins, e fica conversando como se estivesse num ensolarado domingo no campo.
Ainda bem que esses ódios dão e passam. Mas acho que não senti-los é muito grave, é sinal que a gente tá cedendo.
Nisso, eu discordo da sua amiga. A gente não deveria ceder. Se desse pra fazer isso sem deixar um roxo na cara alheia, melhor...
E não esqueci q vc ainda não foi ver "Vamos?"

Só no blog disse...

Querido, eu tenho um amigo que comprou um daqueles sacos de boxe, sabe? Encheu de areia e pendurou na garagem. Sempre que tinha vontade de socar alguém, ele ia lá e socava o saco, no bom sentido, né? Segundo ele, relaxava muito.
Vou ver o Vamos na semana que vem, pode contar.
Senão é o Gruli e você que vão me pegar de soco - mas pode deixar o olho roxo. Nos dias de hoje, é charme!!!

Anônimo disse...

Esses dias, na argentina, um argentino, depois de me tentar me expulsar de um bar (ele trabalhava no local e não tinha razão pra tentar fazer isso), ficou me provocando várias vezes outros dias, além de uma certa vez ele não ter quisto dar a chave da porta do meu quarto (eu estava hospedado no lugar que ele trabalhava), de ter me hostilizado, provocado meus amigos, não aguentei, chegou uma hora que eu pirei, e pra não causar um problema pra todo mundo (se eu batesse no carinha, certamente seria delegacia), que era bem menor que eu, enfim, pra evitar isso, sem perceber, na raiva, eu dei um soco na janela, arrebentei o vidro e minha mão ficou vazando sangue... não parava, eu super calmo tentando colocar gelo, apertando com guardanapos, e nada de estancar o líquido... depois de um tempão, de minha pressão ter caído, o corte parou de vazar. O argentino parou de me tratar tão mal, mas acho que algum colega de trabalho dele deu um toque pra ele, tipo "para de infernizar o brasileiro", mas eu voltei com a mão arrebentada, e poderia ter sido pior se eu tivesse cortado um tendão, teria perdido o movimento da mão, ou de um dedo! Mas que voou estilhaços pra todo lado voou, pena que minha mão não é de ferro!
Alex Alex

Kiko Rieser disse...

Tem gente que merece MESMO apanhar! Gente que não sabe dialogar se trata como? Na porrada!

Anônimo disse...

Kiko acho que resolver alguma coisa so NA PORRADA é partir para ignorancia!!!! Se alguem nao sabe conversar, saiba vc ser mais inteligente e no minimo ignorar!!!!

Robert William disse...

Muito Bom!