Renan e Raul são gêmeos. Têm pouco mais de quatro anos e estudam em uma escolinha na Zona Leste. A professora tem de estar sempre alerta, pois as brigas entre os dois são muito constantes. Sempre que os aluninhos precisam formar fila, Raul tem de ser o primeiro e Renan, o último, para evitar previsíveis empurrões ou puxões de cabelo. Renan não tolera nenhum tipo de disciplina. Se ele está gostando da aula de pintura, não entende por que tem de abandonar o lápis de cor para ir ao playground. E, uma vez no playground, recusa-se a tirar a sonequinha da tarde, coisa que todos os coleguinhas fazem com indisfarçável prazer. A professora já disse várias vezes ao Renan, diante de toda classe, que precisa ter uma conversinha séria com seu pai sobre sua falta de modos, mas ele não se importa. Semana passada, revoltado com os horários rígidos da escolinha, amassou um caderno e jogou no chão. Raul, ao contrário, nunca tirou a professora do sério.
Renan e Raul jamais foram repreendidos pela mãe, que parece viver apenas com o intuito de realizar os desejos dos gêmeos. Não faz muito tempo Renan, depois de fazer alguma malcriação, mostrou a língua para a mãe. Ela sorriu diante desta pequena ousadia. À noite, Renan repetiu a dose, desta vez na frente do pai, que lhe deu, ainda que de leve, um inesperado tapa na boca. Desde aquele dia, ninguém mais viu a língua de Renan em casa. Não que Raul seja exatamente bonzinho. Ele também gosta, nos dizeres do pai, de fazer muita arte. Subir no braço do sofá e dar cambalhotas é a sua arte preferida. Um dia, o pai avisou: Para com isso que você vai acabar caindo. Na terceira cambalhota, Raul caiu de cabeça no assoalho e viu nascer, em segundos, um gigantesco galo na sua nuca. O pai, assustado, na mesma hora levou o garoto ao pronto-socorro. O médico examinou e disse: não é nada. O pai exigiu um raio-X. Não era nada. Só de pensar no que estes meninos aprontam, eu já fico suado, o pai disse o médico.
Renan e Raul são frutos do segundo casamento do pai. Do casamento anterior, ele saiu com três filhos: uma moça de 22 anos, muito bem-casada graças a Deus, um garotão de 17 e um menino de 11. São filhos que nunca lhe deram muita preocupação. “Não estava mais dando certo viver com a mãe deles, mas pelo menos ela criou bem as crianças”, revelou sem deixar claro se isto deveria ser recebido como um insulto ou um elogio à antiga esposa.
Ouvi todo este relato, calado, no ônibus que me levou da estação Vila Madalena do metrô à rua da Consolação, na ensolarada manhã desta quarta-feira. A conversa toda durou o tempo de um Halls de menta. Desci do ônibus certo de que, por R$ 2,30, tinha ouvido uma história com final feliz, ao menos até agora.
Renan e Raul podem continuar tranquilamente com suas traquinagens. Seus nomes foram trocados.
quarta-feira, abril 08, 2009
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6 comentários:
AMEI!!!
(adoro conversas de ônibus...)
Ha-ha-ha ! Como algumas pessoas desabafam para estranhos em plenas viagem de ônibus. Gente, genial! Sem noção! Mas coitado, esse pai de dois capetas precisava desabafar. Assim nao precisa gastar grana do leitinho das crianças com terapia.
Sérgio,
Sorte nossa que você não é daqueles passageiros que dormem quando sentam no banco do ônibus. Delícia de história. Quantas histórias como essa andam por aí nos ônibus, metrôs, botequins, a espera de serem ouvidas. Gostei do Halls de menta.
Abraço,
Jurandir
Brigadão, Jurandir. Tinha até mais coisa na história, mas achei que já tava bom.
Abração
Anita, era um paizão muito engraçado, pode crer.
Valeu, Isabela, beijão
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