quinta-feira, novembro 15, 2007

Por um mundo sem palitos

Este ano eu endossei muitas campanhas que me chegaram pela Internet, todas com um inegável objetivo (ou apelo) social, humanitário ou ambiental. Bom, em primeiro lugar, esta divisão já me parece ilógica: nos dias que correm, estas três coisas não devem ser mais vistas de forma isolada. Botei meu nome na campanha contra a prorrogação da CPMF, contra a continuidade da exploração irracional da Amazônia, contra a lei que previa cortes nos recursos destinados ao Sesc, Sesi e Senac, contra a morte cruel dos animais nos centros de zoonose, contra a utilização dos burrinhos que puxam carroças em pleno ano de 2007 no centro de Porto Alegre, contra a permanência de Renan Calheiros na presidência do Senado e outras tantas que, nesta sexta-feira de chuva e frio, me fogem à lembrança.

Talvez por ter sido tão entusiasta destas campanhas virtuais, me reservo o direito, agora, de lançar minha própria campanha, de caráter muito mais restrito, de alcance pouco nobre, de simpatia duvidosa e, acima de tudo, de interesse próximo do zero. Mesmo assim, vou lançá-la: dou início hoje, como um Don Quixote dos bons modos, a uma campanha contra as pessoas que palitam os dentes em público! Elas não só existem, como estão se multiplicando de modo assustador. Estes gremlins, que representam um ataque diário à boa educação à mesa, estão escapando dos restaurantes por quilos (dos quais sou frequentador diário) para atacar também naqueles ambientes um pouco mais chiques e caros, onde a gente só vai quando é convidado ou quando a situação exige toalha de linho branco sob nossos pratos - sem couvert e sem sobremesa, por favor, que a situação tá brava.

Uma vez um leitor perguntou para a Danuza Leão se existia alguma ocasião em que era possível palitar os dentes. Ela respondeu que só se a pessoa estivesse trancada no banheiro, com a luz apagada e de costas para o espelho, pois a situação é tão desagradável que não merece ser testemunhada nem pelo próprio autor. Fecho questão com a Danuza. Palitar os dentes em público é abominável. Passar cotonete nos ouvidos ainda é prazeroso: faz uma coceguinha, lembra um carinho e remete à uma ternura materna de infância. Mas que prazer existe em palitar os dentes? Alguém se lembra de algum dia a mãe ter nos procurado com um palito afiado na mão e mandado a gente abrir a boca para ela cavoucar no esconderijo dos nossos molares? Nunca, não é! É um raciocínio simples, confesso: mas se nunca nos ensinaram, nem na escola e nem na nossa casa, que os dentes devem ser palitados, por que raios as pessoas continuam fazendo isso uma na cara das outras?

Uma noite dessas entrei no restaurante Piolim, ali na Rua Augusta. Numa mesa de canto estava, vestida toda de preto, uma das melhores atrizes da nova geração, num papo animado com um rapaz que eu não conhecia. Terminado o jantar, com a graça de uma Julieta, ela começou a palitar todos os seus muitos dentes. Pronto, na hora ela se transformou, para mim, na noiva do Shrek. É implicância minha? Claro que é. Podem dizer que é viadagem, mas uma estrela não palita os dentes em público. Aliás, não palita os dentes, e ponto final. Alguém é capaz de imaginar Audrey Hepburn com um palito nas mãos? É capaz de ver Nicole Kidman tirando um fiapinho de salmão que entalou entre seu canino e o primeiro molar? Já imaginou um palito interferindo na simetria perfeita e carnuda dos lábios de uma Marilyn Monroe? Quer tirar totalmente o glamour, a compostura e a elegância de uma pessoa? Dê-lhe um palito de dentes. Não há nada que resista a eles.

Pronto, lancei as bases e os argumentos da minha campanha. SEi que ela não terá alcance nenhum e que, já no almoço de amanhã, vou vê-la naufragar na mesa ao lado da minha. Tem gente que sonha com um mundo mais justo, um mundo sem criminalidade, um mundo em que as crianças tenham um futuro garantido, um mundo verde em que o meio ambiente e os animais sejam respeitados, um mundo mais compreensivo e seguro. Eu sonho e luto por tudo isso também. Mas confesso que vou ficar muito mais feliz se neste mundo ideal não houver mais lugar para os palitos!

6 comentários:

alberto disse...

tou contigo e não admito discussão do assunto. abaixo o palito.

Rafinha! disse...

hahaha agora me veio as ocasiões em que, mesmo contrariado, precisei recorrer ao bom e velho palito! argh, poderia ao menos ter ido ao banheiro, mesmo. rs!

Anônimo disse...

to contigo na campanha, massinha!! abraçoaí!

Anônimo disse...

aliás, me lembrei da piada do vicente matheus, 'palitando' os dentes em uma churrascaria com a faca. vem o garçom: 'temos fio dental no banheiro; o sr. não quer usar?' e o matheus:'não, tenho a bunda muito cabeluda...'

Viralata disse...

Eu sempre fui a favor de umas coisinhas que caíram em desuso como: "escarradeira", "água-de-lavanda" e "bochecho"! Com isso em todos os restaurantes da cidade jamais presenciaríamos cenas tão dantescas e nem precisaríamos nos ausentar das mesas após os jantares. Você não acha?
bj

Anônimo disse...

salve sergio, postei esse texto no meu blog, com crédito e tal. abraço