Leio, como milhares de pessoas acredito eu, os trechos do livro em que a jornalista Mônica Veloso promete discorrer sobre os bastidores do poder em Brasília. A coluna da Mônica Bérgamo, na Ilustrada deste domingo, publicou alguns destes trechos. A primeira impressão é a de que Mônica vai falar pouco da Brasília capital mundial dos conchavos e da corrupção e muito da Brasília que serviu de cenário para seu romance com o senador Renan Calheiros. Um romance que teve como trilha sonora a música do filme Lisbela e o Prisioneiro executada a três vozes: na emocionante de Caetano Veloso e nas, penso eu, provavelmente desafinadas de Renan e da própria Mônica. O amor, está provado, realmente é lindo.
O livro de Mônica Veloso, escrito em tempo recorde como ensinam as leis do marketing, é a prova definitiva daquilo que todos já intuíam: todo mundo nesta história teve direito a um final feliz. Renan Calheiros, como anunciou a revista Veja desta semana, deve ser absolvido de todas as inúmeras acusações que pesavam contra ele, em troca da aprovação da CPMF. Soubemos que ele teve suas contas pessoais pagas por uma lobista, vendeu gado superfaturado para empresas fantasmas, usou laranjas para adquirir empresas de comunicação em sua Alagoas natal e tudo vai para o arquivo, do Senado e da nossa memória, porque uma oportuna conjunção de fatores políticos o transformou em peça-chave para a continuidade do imposto que pagamos a cada vez que movimentamos nosso suado dinheirinho no banco.
No caso de Mônica, o destino se mostrou ainda mais benevolente: além de ter faturado uma nota posando nua para a Playboy, o que é um direito indiscutível dela, provavelmente vai ganhar mais uns belos trocados com suas confissões de mulherzinha romântica que, vejam como a sorte é ingrata, foi cair de amores justamente por um dos homens mais poderosos da República...Mônica e Renan terão um lindo Natal e nós, se quisermos comprar uma sidrae um panetone com cheque, pagaremos alguns centavinhos para o governo federal por conta desta CPMF prorrogada.
Mas eu acho que merecemos tudo isso, e mais todo o resto previsto para cair nas nossas cabeças. Penso como seria fácil mostrar a nossa indignação diante de tudo isso: era só cruzar os braços e, por exemplo, não comprar a Playboy que trouxe Mônica na capa. Os franceses, os argentinos, os americanos e tantos outros povos mais maduros que nós, saem às ruas, com ou sem razão, sempre que alguém pisa em seus calos. Aqui, ninguém precisava bater panelas nas esquinas. Bastava não comprar a Playboy com Mônica na capa e, me desculpem pela falta de elegância, continuar batendo punheta com a revista do mês anterior. Este encalhe da Playboy seria uma maneira muito mais gostosa de gozar na cara desta situação toda. Mas o que foi feito? Todos corremos às bancas para ver as curvas e a borboletinha tatuada na bunda da mulher que o senador tinha papado. Bem feito pra gente. Teremos, agora, uma segunda chance de realizar o protesto que não foi feito há dois meses: cruzar os braços e não comprar o livro de Mônica...
Claro que é uma ilusão idiota. Em poucas semanas, o livro estará na lista dos mais vendidos e será, seguramente, o presente mais requisitado nas festas de amigo secreto. E não duvido que, em questão de dias, surja um cineasta que de tão comovido com o relato pungente de Mônica, mostre-se disposto a transformar em filme suas confissões tão oportunas.
Na mesma Folha em que lemos sobre o livro de Mônica e na mesma revista Veja que anuncia a absolvição de Renan, vemos também a tragédia da adolescente de 15 anos que foi estuprada seguidas vezes durante os dias que passou presa numa cela só com homens, no Pará. A jovem teve os pés queimado com cigarros, seu cabelo cortado com facão e era estuprada em troca de comida. Por que colocá-las no mesmo saco, alguém poderia perguntar. Simples. Porque, cada uma a seu modo, Mônica e esta pobre adolescente estão aí para esfregar na nossa cara dois lados de um Brasil hipócrita, perverso, selvagem e hediondo.
domingo, novembro 25, 2007
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