Confesso que nunca entendi direito qual a diferença entre paixão e amor e, entendo menos ainda, porque estes dois sentimentos aparentemente não podem conviver. Nos artigos e matérias que já li sobre o tema (talvez eu não tenha lido o que precisava) a paixão costuma ser descrita sempre como algo fugaz, sintomático, alguma coisa que parece já ter nascido com os dias contados. Me lembro que um renomado psicólogo há pouco tempo escreveu, em sua coluna num grande jornal, que a paixão dura em média dois anos – como se os nossos sentimentos de vez em quando resolvessem produzir uma bienal. Outros especialistas costumam se referir à paixão como sendo a infância do amor, no máximo sua adolescência – uma fase de trapalhadas, sobressaltos, confusões e uma quantidade de adrenalina que vai muito além do desejável. Já o amor seria a maturidade do sentimento, uma elevação, um nirvana que nos deixaria mais seguros e pacificados. Algo que, com um pouco de sorte, poderia durar a vida inteira e ter somente um único alvo.
O que eu nunca compreendi, realmente, é se a gente não pode estar apaixonado (ou apaixonar-se) pela pessoa que a gente ama. Ou o inverso: não podemos amar aquela pessoa por quem nos apaixonamos? Os manuais de psicologia parecem dizer que não: ou é uma coisa ou outra. Ou a serenidade do amor ou o fogo da paixão, pois nesta aritmética de possessão, as duas coisas não podem habitar o mesmo corpo.
No fim da tarde do sábado, eu estava tomando um café na Vila Madalena com um amigo. O celular dele tocou – e sempre que isso ocorre, sei que vai demorar um bocado para ele desligar. Não que ele seja mal-educado, talvez seja apenas ocupado, ainda que numa tarde fria de sábado. Enquanto ele falava ao telefone, reparei que na mesa ao lado três garotas tentavam definir o que uma quarta estava sentindo. Como não ouvi o início da conversa, imagino que esta quarta garota tivesse contado de seu recente interesse por um carinha. Então uma delas perguntou: “Mas o que você está sentindo? É paixão ou é amor?”
E ela cometeu a insensatez de dizer que não sabia. A segunda garota, um pouco mais alterada, emendou: “Como não sabe? Todo mundo sabe isso. Ou é paixão ou é amor. Você precisa saber o que é”. Ela tentava explicar que gostava de sair com o cara, estava curtindo este início de relacionamento, as coisas pareciam caminhar bem e, por isso, preferia deixar rolar. A terceira garota, até então calada, resolveu colaborar. “Então talvez não seja nem amor e nem paixão. Acho que é só sexo”. A primeira garota, incomodada com a falta de diagnóstico, prosseguiu. “Ainda que seja só sexo ela precisa saber o que é. Suas pernas tremem quando ele chega perto?” A garota sabatinada respondeu que um pouco. Acrescentou que ainda ficava um pouco vermelha, sem assunto e a garganta parecia secar. Como se tivesse acabado de diagnosticar um caso de gripe suína, a primeira garota respirou aliviada. “Ah, são todos os sintomas da paixão. Pronto, é isso que você sente”.
E, com isso, parece ter resolvido o problema da amiga. Ou, quem sabe, colocado um ponto final numa fase prazerosa para a qual a jovem não estava a fim de procurar nenhuma definição. Ela saiu para tomar um café e, aparentemente a contragosto, voltou apaixonada para casa. Meu amigo desligou o telefone, pediu outro café e retomamos nosso assunto que, pelo que me lembro, era bem menos interessante que o papo das garotas. Eu voltei para casa sem entender direito, ainda, o que é amor e o que é paixão. Mas eu prefiro assim. Se alguém souber a diferença exata, por favor, não me conte.
domingo, outubro 04, 2009
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3 comentários:
Também não sei a diferença e também prefiro não saber. Acho que essa coisa de definição de sentimentos é extremamente desnecessária. E quem tenta definir, acaba deixando a coisa confusa, e pior, sem poesia alguma. Puro desperdício. Vamos AMAR, APAIXONAR...me parece muito melhor...
Beijo Sérgio!
"como se os nossos sentimentos de vez em quando resolvessem produzir uma bienal", muito boa!
A diferença eu não sei qual é e nem me interessa, na verdade. O negócio é amar, como disse o Carlos Lyra.
beijos e boa semana procê!
Roveri, que o meu marido não me escute, mas o que eu sinto por você não é paixão, é amor.
Amo seus textos.
Bjos,
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